Unibes Cultural relembra trajetória do Bom Retiro

Desiree Suslick – Especial para a TJ

Bairro operário, bairro fabril, bairro industrial, bairro proletário, bairro dos judeus. Esse é o Bom Retiro, um local na cidade de São Paulo que recebeu imigrantes da Europa, principalmente do leste europeu, nas primeiras décadas do século 20 e que continua sua tradição, atraindo, nos anos recentes, outros de vários países, da América Latina ao sudeste asiático. Foi neste bairro, ao longo da ferrovia e seus arredores, que os judeus estabeleceram suas residências, seus comércios e indústrias, conferindo uma identidade étnica ao local.

Esses aspectos e muitos outros do bairro que ocupa um lugar especial na memória e no coração da comunidade judaica paulistana foram abordados no curso on-line “Bom Retiro – 1938 a 1953: Polacas e imigrantes à procura de um lugar seguro”, ministrado pelo professor Enio Rechtman, com curadoria de Christine Liu, na Unibes Cultural ao longo do mês de setembro.

Durante quatro aulas, ele analisou o processo de imigração através da história do bairro e a presença judaica, a trajetória das polacas (prostitutas judias) e o confinamento do meretrício na região. As aulas tiveram como base as pesquisas feitas para elaboração de sua tese de mestrado “Itaboca, rua de triste memória: imigrantes judeus no bairro do Bom Retiro e o confinamento da zona do meretrício (1940 a 1953)”, defendida no Centro de Estudos Judaicos da USP.

Localizado entre os Rios Tietê e Tamanduateí, no século 19 o Bom Retiro era formado por chácaras e sítios que eram usados como locais de retiro pela população mais abastada da cidade. A então “Chácara do Bom Retiro”, que nomeou o bairro, foi comprada em 1860 pelo judeu alsaciano Manfred Meyer, para ali instalar uma olaria que levaria o seu nome e que se tornou a maior da capital.

Bairro das elites

Rapidamente o bairro das elites se transformou em bairro operário. A partir da década de 1920, começaram a chegar os primeiros judeus, russos, poloneses e lituanos, cujo fluxo migratório foi intensificado com a aproximação da Segunda Guerra Mundial. Os italianos e portugueses também deixaram suas marcas no bairro, com fluxos migratórios anteriores à vinda dos judeus.

O Bom Retiro foi o berço do futebol nacional. O primeiro campo oficial do país foi demarcado em uma propriedade na avenida Tiradentes, a Chácara Dulley. Foi também perto dali, nas esquinas da rua José Paulino com a Cônego Martins, que, em 1910, cinco amigos se reuniram à luz de um lampião para fundar um dos times mais tradicionais do país: o Corinthians.

Conhecido ao longo das primeiras décadas como bairro judaico, por possuir uma população judaica significativa em relação aos demais imigrantes, tinha, também, a fama de abrigar mascates e prostitutas que na época eram popularmente conhecidas como polacas.

O bairro foi então escolhido pelo interventor Ademar de Barros para confinar a Zona do Meretrício da cidade de São Paulo, que entre 1940 e 1953, ficou sob controle do Estado de São Paulo, decisão que não foi bem recebida pela população da região, principalmente a comunidade judaica organizada. A principal rua que abrigava as casas de tolerância chamava-se Itaboca, mas, devido à má fama, após o fechamento da Zona, um projeto de Lei impôs a mudança de nome e passou a ser chamada de Professor Cesare Lombroso.

Desde a chegada dos primeiros imigrantes judeus aos dias de hoje, o bairro passou por várias transformações. A partir das décadas de 1960 e 1970 a população judaica migrou para outros bairros, sendo gradativamente substituída por imigrantes de diferentes países. Mas o Bom Retiro ainda mantém a sua singularidade.

Pesquisa feita pela revista inglesa Time Out com 27 mil pessoas, o Bom Retiro aparece como o bairro mais “cool do Brasil” e o 25º. colocado do mundo. A Rua Três Rios foi eleita a sétima rua mais legal no ranking de 30. Requisitos como comida, diversão, cultura e comunidade foram avaliados na classificação. A via paulistana foi a única do Brasil na lista. Ainda de acordo com a pesquisa da publicação, o Bom Retiro é um dos centros mais históricos da cidade. A julgar pelo curso da Unibes Cultural, um local também com muitas histórias a serem contadas.

Informações gerais

Nascido e criado no Bom Retiro, formado Bacharel e pós-graduado pela PUC SP em História, Enio
Rechtman fez mestrado no Centro de Estudos Judaicos USP SP em 2015 que resultou na tese ‘’Itaboca, rua de triste memória: imigrantes judeus no bairro do Bom Retiro e o confinamento da zona do meretrício (1940 a 1953”. A curadora do curso Christine Liu é produtora executiva e diretora Vega Filmes. Também nascida em São Paulo, atua no mercado há mais de 35 anos, produz e dirige filmes, vídeos, eventos e obras de vídeoarte. TJ

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