André Lajst fala sobre o pacto político em Israel

Joel Rechtman - Editor Executivo da TJ

Tribuna Judaica: Finalmente tivemos notícias de um acordo entre Netanyahu e Gantz. Quais são os principais pontos deste acordo?
André Lajst: Por um lado, temos aspectos políticos interessantes, como a rotação entre Netanyahu e Gantz, os dois com poder de veto para assuntos cruciais e pastas importantes como defesa, relações exteriores e justiça. O país terá um governo relativamente forte e há muito mais em comum entre o Kahol Lavan, partido de Gantz e o Likud, do que estes com os partidos ultra-ortodoxos. Haverá uma “democratização” de decisões entre os dois partidos e isso poderá ser positivo para que o país avance em temas que estão estagnados há alguns anos.

Por outro lado, as negociações para que Gantz e Nentanyahu assinassem um acordo foi difícil, pois Netanyahu está sendo julgado por corrupção. Caso decisões judiciais da suprema corte ou leis dentro do parlamento digam que um politico sendo julgado em casos criminais, como neste caso, não poderá assumir o cargo de primeiro-ministro ou este cargo em exercício, isso impediria que Netanyahu assumisse o cargo de primeiro-ministro em exercício (na prática vice-primeiro-ministro) em outubro de 2021, quando Gantz for nomeado primeiro-ministro. O Likud e Netanyahu tentaram de diversas formas “proteger” Bibi e fazer com que seu cargo estivesse garantido ou novas eleições seriam convocadas.

Em geral, podemos dizer que há aspectos positivos que foram alcançados nestas negociações, como o fato de que haverá um ministro da comunidade etíope, uma mulher religiosa ortodoxa e um árabe muçulmano. É a primeira vez em 36 anos que Israel possui um governo de rotação, na qual duas pessoas trocam o papel de primeiro-ministro, neste caso, um não pode demitir o outro enquanto estiver no cargo, tampouco ministros do campo político do outro. Caso um deles dissolva o parlamento, o outro será o primeiro-ministro de transição. Se tudo ocorrer bem e Netanyahu seguir no cargo até outubro de 2021, Benny Gantz será o 13º primeiro-ministro do Estado de Israel.

TJ: Qual e a sua avaliação sobre o futuro politico de Israel?
AL: Em Israel nunca dá para saber o futuro político. Tivemos agora 484 dias de impasse político. Porém, acredito que se tudo ocorrer bem, teremos novas eleições em 3 ou 4 anos, o que é algo raro em Israel. O escritor Amos Oz falava que não é possível falar nada do futuro em Israel, porque a competição é grande, num lugar onde viveram tantos profetas.

TJ: Israel tem oferecidos opções e soluções importantes para amenizar a questão da Pandemia. Quais são ações que se destacaram?
AL: Israel foi um dos primeiros países a fechar suas fronteiras aéreas e implementar quarentena de 14 dias a todos os passageiros que chegavam de fora do país. O país tem um número relativamente alto de infectados em relação ao seu tamanho, porém um número baixo de internados em estado grave e um índice de mortalidade dos mais baixos do mundo. Isso se deve a uma política rígida de isolamento social, inclusive com toques de recolher no começo e no final de Pessach, já que quase tudo está fechado, e milhares de testes sendo conduzidos em suspeitos de terem tido contato com pessoas infectadas. O serviço secreto, com autorização do procurador geral e o ministério da justiça, está utilizando tecnologias antiterrorismo para encontrar pessoas que possam ter sido infectadas e não sabem. A população de Israel está acostumada com situações de emergência e se adapta com certa “facilidade”.

TJ: Hoje há uma discussão de como enfrentar socialmente o Coronavírus. Nesse sentido, qual o exemplo que Israel está dando para o mundo?
AL: Acredito que o exemplo que Israel está mostrando ao mundo é de que a vida vem antes de questões econômicas, de que a ciência e especialistas em pandemias precisam ser escutados e envolvidos nas decisões políticas durante a pandemia e de que o isolamento social não é uma questão política de esquerda e direita e sim uma questão de de saúde pública. Israel, assim como outros países, tem um número limitado de respiradores. Caso o país chegue à lotação, o sistema de saúde entraria em colapso. Acredito que, nesse sentido, Israel deu exemplo, inclusive a países europeus, como citado pelo chanceler austríaco Sebastian Kurz, que disse em entrevista a mídia de seu país, que, após uma conversa com Netanyahu pelo telefone, decidiu implementar mais medidas preventivas no seu país.

TJ: Já antes da crise, testemunhamos comunicadores amadores, blogueiros e até pessoas bem intencionadas tentando defender Israel, mas por infelizmente não serem do ramo, acabam prejudicando a imagem do país, produzindo, por assim dizer, “fogo amigo digital”. Como combater este fenômeno?
AL: Há mais de uma década, a StandWithUs tem ensinado em diversos países, sobre o conceito de “Israel imaginária” que existe na mente de diferentes populações. O termo ficou tão conhecido que outras instituições e indivíduos, inclusive oficiais do governo de Israel, começaram a utilizar o termo, para mostrar que existem pessoas, até mesmo bem-intencionadas, que criam uma imagem falsa do país para justificar suas agendas em outros países. Nesse sentido, podemos dizer que parte da esquerda brasileira e parte da direita brasileira, tem uma imagem equivocada de Israel. Para combater, isso temos que nos apoiar em educação de qualidade, isenta de ideologia e que traga vários aspectos da sociedade israelense. Esse trabalho é desenvolvido de diversas formas pela StandWithUs Brasil.

TJ: Recentemente, nas nossas mídias sociais, parafraseamos Ben Gurion, que dizia: “o difícil se faz agora, o impossível demora mais um pouco”. O que este grande líder, se estivesse entre nós, falaria hoje sobre a situação política israelense?
AL: (Risos) Ben Gurion era um apaziguador. Entendida a necessidade de haver ortodoxos apenas estudando a Torá, que, segundo ele, “serão a próxima geração de rabinos que guiarão o povo no futuro em aspectos religiosos”. Ele acabou cedendo a algumas questões religiosas para formar o primeiro governo de coalizão em Israel. Alguns resquícios dessa coalizão, sentimos até hoje. Acredito que há uma questão muito grave que divide a sociedade israelense por dentro, que é o fato de os ultra ortodoxos não fazerem exército e receberem verbas públicas para as Yeshivás. Governos caíram e coalizões não foram formadas por estes motivos no passado recente. Creio que, caso Ben Gurion estivesse presente, ele faria o possível e o impossível, para chegar a um termo comum e pacificar este debate tão intenso e importante na sociedade israelense.

TJ: O StandWithUs Brasil tem, de maneira ímpar, divulgado de maneira positiva a verdadeira realidade de Israel em um momento bastante delicado. Como se comportar nesta guerra?
AL: Em primeiro lugar, precisamos ter ética. Todos nós devemos saber cooperar para proteger a imagem de Israel na academia e na mídia. Nós estamos fazendo um trabalho, ao meu ver, essencial para Israel e para a comunidade judaica, pois temos cooperado com outras instituições para podermos ensinar sobre Israel, falar sobre o país de forma clara, neutra e verdadeira, mostrando erros e acertos e desmistificando o conceito da “Israel imaginária”. Acredito que, não devemos inventar informações sobre uma Israel perfeita, pois ela não existe. Temos, sim, que ensinar a história de Israel alicerçada nos valores e fatos que, por si, falam mais do que imagens, jargões e frases de efeito.

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